Governo destina menos verba para ações de saúde, educação e moradia voltadas a mais pobres


De olho na campanha à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) turbina o Auxílio Brasil, mas o governo acumula resultados negativos em outros programas sociais. A verba para habitação, saúde e educação da população mais pobre tem passado por sucessivos cortes ao longo da gestão bolsonarista.


Marcas petistas, como o Farmácia Popular e o Fies, registram queda no orçamento desde que Bolsonaro assumiu o mandato. Até o programa Casa Verde e Amarela –vitrine criada por ele na construção de moradias – não foi poupado. A redução nos recursos para esses projetos na área social tem consequências. O número de casas entregues nos anos Bolsonaro recua. A quantidade de farmácias credenciadas para atender a população de baixa renda também caiu.

A exceção é o programa de transferência de renda, o Auxílio Brasil, criado no ano passado para dar a Bolsonaro um legado social e substituir a forte marca petista do Bolsa Família. Numa coalizão entre a equipe econômica e a ala política do governo, o Auxílio Brasil foi desenhado para quebrar recordes de famílias atendidas e valores transferidos, mesmo que isso exija driblar regras de controle de gasto público.


Em mais um desses acordos, o governo espera aprovar nesta semana uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria novos benefícios sociais, apesar das limitações legais em ano eleitoral, além de ampliar o valor do Auxílio Brasil para R$ 600 e zerar a fila de espera do programa.

Enquanto isso, a principal iniciativa nos últimos anos para tentar reduzir o déficit habitacional no país enfrenta um cenário bem diferente. O Casa Verde e Amarela tem um orçamento de R$ 1,2 bilhão neste ano –o menor da história.


De 2009 a 2018, a média destinada ao antecessor do programa habitacional (Minha Casa, Minha Vida) se aproximava de R$ 12 bilhões por ano. No primeiro ano do governo Bolsonaro, o presidente recebeu um Orçamento prevendo R$ 5 bilhões para esses projetos voltados à moradia para população de baixa renda.


Com o aperto na verba, menos unidades habitacionais são contratadas para serem construídas. São cerca de 350 mil por ano sob Bolsonaro. Entre 2014 (quando a situação das contas públicas se agravou) até 2018, foram 438 mil por ano, em média. Em relação às casas entregues, são 410 mil por ano no atual governo. Entre a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o período de Michel Temer, a média foi de 544 mil por ano.

“Em razão do cenário de restrição orçamentária, o programa Casa Verde e Amarela foi impactado, assim como outros programas do governo”, afirma o Ministério do Desenvolvimento Regional, responsável por gerir essa área.


A pasta diz, então, que passou a priorizar a conclusão de obras que estavam paralisadas –das 180 mil unidades habitacionais que estavam paradas, 130 mil foram retomadas. Além disso, promoveu um corte nos juros do programa para o menor patamar da história.


A marca de Bolsonaro na área habitacional, porém, acabou com a faixa do Minha Casa, Minha Vida que atendia as famílias de renda mais baixa e que poderiam assinar contratos com subsídio de até 90% do valor do imóvel, sem juros. Para Sérgio Praça, professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais da FGV, o presidente Bolsonaro prioriza o programa Auxílio Brasil por ser um gasto social capaz de gerar dividendos eleitorais de forma mais imediata.

“Ele [Bolsonaro] é a cara do Auxílio Brasil, a cara desse aumento [no benefício]. Assim, ele consegue tomar crédito político alto por isso. Manter o orçamento de outros programas [sociais] seria ótimo para a população, mas isso tem menos impacto na campanha política”, disse o professor.


Com a PEC e as expansões anteriores no programa de transferência de renda, o presidente, segundo Praça, tenta cristalizar o cenário de que a corrida ao Palácio do Planalto seguirá para o segundo turno –apesar da vantagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas de intenção de voto.


Criado para distribuir remédios gratuitos ou com descontos à população de baixa renda, o programa Farmácia Popular foi reduzido na gestão de Bolsonaro.


Desde 2020, primeiro ano da pandemia, são cerca de 20 milhões de beneficiários no programa. Isso representa 1,2 milhão a menos que no ano anterior. A cobertura já foi de 22,8 milhões sob Temer.

Farmácia popular

O Farmácia Popular distribui medicamentos básicos gratuitamente para hipertensão, diabetes e asma por meio de farmácias privadas conveniadas. Remédios para controle de rinite, mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, além de anticoncepcionais, são vendidos com desconto de até 90%.


A quantidade de farmácias também caiu para cerca de 30 mil unidades. No início do atual governo, eram 31 mil. Em 2015, auge da rede de atendimento, havia 34,6 mil farmácias.


O Ministério da Saúde diz que “não houve redução no orçamento do programa, considerando os valores previstos na LOA [ou seja, no Orçamento]”,


No entanto, por causa da inflação, a redução na verba chega a quase 25% na comparação com 2018. Os recursos, corrigidos pela inflação, recuaram de R$ 3,2 bilhões para R$ 2,4 bilhões (valor previsto para esse ano de eleição).

A pasta da Saúde reforça que o programa tem o objetivo de complementar a distribuição de medicamentos, cujo principal acesso é pelas Unidades Básicas de Saúde ou farmácias municipais.


Fies

Na área educacional, o Fies –programa para estimular o acesso da população de baixa renda ao Ensino Superior– também perdeu espaço. O orçamento dessa iniciativa foi reduzido de R$ 22 bilhões em 2018 para R$ 5,5 bilhões neste ano. Procurado, o Ministério da Educação não se manifestou sobre o corte.


Técnicos dizem que o Fies cresceu de forma desordenada sob Dilma e, por causa da crise nas contas públicas, regras mais rígidas para a concessão de financiamentos foram adotadas no governo Temer. O objetivo é reduzir a inadimplência.


No programa, parte das mensalidades de estudantes em universidades privadas são pagas pelo governo. Em troca, os beneficiários precisam quitar o financiamento após a formatura.

Desde 2020, o número de contratos assinados tem sido praticamente a metade da quantidade de vagas oferecidas.


Com informações da Folha de S. Paulo